Um argumento alega que o Escrituralismo [1] é incoerente porque a proposição, “Todo conhecimento vem de proposições bíblicas e suas implicações necessárias”, não é ela mesma uma proposição bíblica, e não pode ser deduzida a partir de proposições bíblicas; portanto, se alguém aceita o Escrituralismo, essa pessoa deveria rejeitar o Escrituralismo.
Contudo, esse argumento é uma falácia lógica. De fato, ele está dizendo apenas que o Escrituralismo é falso porque ele não é verdadeiro, mas ele diz isso sem mostrar que o Escrituralismo não é verdadeiro.
Mas o princípio pode ser de fato deduzido a partir da Escritura. A Bíblia ensina que Deus é infalível, que a Bíblia é sua revelação infalível, que Deus controla todas as coisas, que o homem é falível, que as sensações e intuições do homem são falíveis, etc., etc. – coloque tudo isso junto, e você tem o Escrituralismo.
Então, pense sobre o empirismo. Sim, é frequentemente assumido que a sensação é um modo geralmente confiável de se obter conhecimento. Mas considere apenas alguns dos problemas relacionados ao empirismo e à ciência:
1. Se o empirismo é racional, então deveria ser possível demonstrar sua racionalidade por um processo válido de raciocínio. Qual é esse processo de raciocínio? E ele é realmente válido?
2. Se o empirismo necessariamente usa a indução, então como ele pode evitar os problemas lógicos que acompanham a indução?
3. Se o empirismo é o próprio fundamento da ciência, então como a ciência pode ser considerada eminentemente racional quando ainda temos que defender o empirismo?
4. Então, o que dizer sobre o fato de que o método científico, por sua própria natureza, pratica a falácia de afirmar o conseqüente em todo experimento?
Alguém que condena minha oposição ao empirismo deve mostrar como ele pode saber algo por sensação através de sua epistemologia parcial ou totalmente empírica.
Ele não pode prová-lo pela “pura razão”, visto que a própria lógica não carrega nenhum conteúdo a partir do qual ele possa derivar uma prova para o empirismo, e usar a intuição como um fundamento para a sensação requereria uma prova para a intuição como um caminho para o conhecimento, bem como um padrão comprovado para determinar que ocorrência de intuição é correta.
Então ele reivindica que a Escritura fornece as pré-condições para o empirismo? Ela certamente fornece as pré-condições para entendermos que ele é irracional e falso, mas ela fornece a justificação racional para dizermos que o empirismo é verdadeiro? Mateus 24:32 não é o único versículo da Bíblia.[2] O que dizer sobre João 12:28-29 e 2 Reis 3:16-24?
Se a Escritura mostra apenas um caso em que a sensação não é confiável, então precisamos pelo menos de um padrão ou método confiável pelo qual podemos dizer que ocorrência de sensação é confiável. Qual é esse padrão ou método? E esse padrão ou método é realmente confiável?
Ou, se eles reivindicam que uma sensação verifica a outra, então isso é uma falácia lógica, visto que não sabemos que uma é certa, e talvez ambas estejam erradas.
Assim, não importa quantas passagens bíblicas eles mostrem, mas enquanto houver ao menos uma passagem na Escritura que sugira a falibilidade da sensação, então voltamos à questão de um padrão ou método pelo qual podemos dizer qual ocorrência é confiável.
Mas eu já disse tudo isso em meus livros e artigos, de forma que tudo o que você precisa fazer é ler ou revê-los.
É engraçado para mim que alguns pressuposicionalistas têm argumentado tão apaixonadamente contra minha oposição ao empirismo, que é como se eles estivessem agora defendendo o empirismo, e duma maneira que frequentemente contradiz o que eles diriam quando eles argumentam contra o evidencialismo na apologética.
Apenas não se esqueça de perguntar se, a medida que eles atacam uma oposição ao empirismo, eles não têm justificado o empirismo. Como eles têm feito isso? E se o empirismo (qualquer grau ou tipo_ é parte da epistemologia deles, então eles devem primeiro justificar o empirismo antes de atacar uma oposição ao empirismo; de outra forma, eles estão apenas argumentando em círculo, enquanto não permanecem em nenhum lugar.
Finalmente, considere isso. Se eles reivindicam que uma pessoa deve usar as sensações físicas para ler a Bíblia, e que, em algum sentido, as palavras da Bíblia são transmitidas à mente através das próprias sensações físicas, e se eles admitem também que as sensações são falíveis, então o fato da Bíblia ser infalível ou não se torna imediatamente irrelevante para eles, visto que eles nunca podem ter uma Bíblia infalível na prática. Isso porque, em efeito, a Bíblia será apenas tão confiável para eles como o são as suas sensações.
Alguns deles dizem que a Bíblia ensina que Deus criou o homem duma forma que o homem pode usar seus sentidos para adquirir algum conhecimento, mesmo que as sensações sejam falíveis. Mas há pelo menos dois problemas com isso:
1. Eles apenas estão dizendo que você deve usar os sentidos para ler a Bíblia em primeiro lugar, mas como eles descobriram o que a Bíblia diz sobre sensações sem primeiro provar a confiabilidade da sensação? Eles argumentam em círculos.
2. A Bíblia fornece muitos exemplos mostrando que os sentidos são falíveis, que eles são frequentemente enganosos. Assim, mesmo que esqueçamos o ponto anterior, ainda estamos embaraçados quanto a quais ocorrências de sensações são confiáveis, e voltamos ao ponto de partida uma vez mais.
Assim, é a visão deles que é realmente incoerente.
Por um lado, meu esquema vence todas essas dificuldades, visto que eu começo a partir da mente de Deus, e não dos sentidos do homem.
Nesse ponto, eles algumas vezes exclamam: “Bem, então você não pode saber nada!”. Mas isso não prova que o empirismo é a saída do ceticismo! Assim, não seja enganado por argumentos como esse.
De fato, meu método sobrepuja o ceticismo por começar com a Bíblia – isto é, ele realmente começa com a porção da mente incorpórea de Deus que tem sido verbalmente revelada na Escritura – ao invés de simplesmente dizer que começamos com a Bíblia, mas então permitir que nossas sensações falíveis sejam o único meio de conhecer o que está na Bíbla em primeiro lugar.
NOTAS:
[1] - Esse é o nome dado à filosofia de Gordon Clark, e frequentemente aplicado a mim também.
[2] - E como já temos mostrado, Mateus 24:32 não pode provar uma epistemologia “Eu vejo, portanto eu sei”.
Extraído e Traduzido por Felipe Sabino, de Captive to Reason, de Vincent Cheung, páginas 34-36.
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